um dia hei-de subir contigo
degrau
a degrau
o arco-íris

jorge de sousa braga

Si le feu brûlait ma maison, qu’emporterais-je?
J’aimerais emporter le feu...

Jean Cocteau

O ano declina






Pedem tanto a quem ama: pedem

o amor. Ainda pedem

a solidão e a loucura.

Dizem: dá-nos a tua canção que sai da sombra fria.

E eles querem dizer: tu darás a tua existência

ardida, a pura mortalidade.

Às mulheres amadas darei as pedras voantes,

uma a uma, os pára-

-raios abertíssimos da voz.

As raízes afogadas do nascimento. Darei o sono

onde um copo fala

fusiforme

batido pelos dedos. Pedem tudo aquilo em que respiro.

Dá-nos tua ardente e sombria transformação.

E eu darei cada uma das minhas semanas transparentes,

lentamente uma sobre a outra.


herberto helder

Eat Me
  Gray Sapphire (Deviant Art) 
 Malevich



(...) perguntou-me se tinha medo do escuro e eu senti uma coisa cá dentro, um consolo, um júbilo, um alívio, a certeza de regressar a casa a seguir a uma viagem sem fim porque quando uma mulher pergunta a um homem se tem medo do escuro é sinal que quer ficar com ele para sempre, é sinal que quer ficar com ele muito tempo.

António Lobo Antunes, O Manual dos Inquisidores, Publicações D. Quixote, 1996

roubado aqui

Agora para Todos

Do Natal - Com Dedicatória



Tu que dormes a noite na calçada de relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitros de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e combóios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher.

Ary dos Santos

Ousadia


Too Big to Fail


Como pode um investimento tão fiável
garantir este rendimento crescente, numa
diária distribuição de beijos e outras mais-
-valias, ainda por cima livres de impostos?


Embora confiasse na tua competência
para criar valor, confesso que não esperava
tanto quando decidi aplicar nos teus títulos
sensíveis os meus parcos activos emocionais.


O mais estranho, no mundo actual, é ser este
um negócio sem perdedores, aparentemente
imune ao nervosismo das tuas acções
ou às flutuações do meu comércio libidinal.


O meu único receio é que despertemos
a invejo dos deuses, no Olimpo de Bruxelas,
e que Mercado, o monstruoso titã, decida
baixar para lixo o rating da nossa relação,


deixando-nos sem crédito na praça romanesca
e em default o coração. Mas não sejamos
pessimistas. Aliás, ambos sabemos que Cupido
nos ampara com sua mão invisível. E mesmo


que entrássemos ambos em depressão, tenho
a certeza de que o Estado português nos daria
todo o apoio, concordando que um amor como
este é simplesmente demasiado grande para falir.


JOSÉ MIGUEL SILVA

'e não sei o que fazer com esta espertina se não beijar-te'

miguel martins
 

Pedido



Take me home, you silly boy
Put your arms around me
Take me home, you silly boy
All the world's not round without you

I'm so sorry that I broke your heart
Please don't leave my side
Take me home, you silly boy
Cause I'm still in love with you