Presídio
Nem todo o corpo é carne ... Não, nem todo.
Que dizer do pescoço, às vezes mármore,
às vezes linho, lago, tronco de árvore,
nuvem, ou ave, ao tacto sempre pouco ...?
E o ventre, inconsistente como o lodo? ...
E o morno gradeamento dos teus braços?
Não, meu amor ... Nem todo o corpo é carne:
é também água, terra, vento, fogo ...
É sobretudo sombra à despedida;
onda de pedra em cada reencontro;
no parque da memória o fugidio
vulto da Primavera em pleno Outono ...
Nem só de carne é feito este presídio,
pois no teu corpo existe o mundo todo!
DAVID MOURÃO-FERREIRA
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